Por que estas pulsões ocêanicas?

Pois é verdade que se eu não havia sequer pensado sobre uma metáfora que ilustrasse com precisão poética e elegância filosófica - sim, com precisão poética e elegância filosófica! - aquilo que encontro frente ao espelho, este reflexo que se produz em minha consciência: ao pensar na força do mar, no impacto voraz das ondas sobre as rochas, no ímpeto por vezes desmedido e incontido de uma pulsão marítima, oceânica, encontro nessa visão a pintura natural de minha própria natureza. E talvez só me falte descobrir onde o pintor escondeu seus pincéis... Mas para quê? Não há em tudo isso significativa - perfeição?

***

A poesia é a capacidade de condensar em belos versos a riqueza experiencial de nossas impressões. Ela é a mais elevada forma de arte literária - na verdade, literatura só é arte se participa intrinsecamente da poesia.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

O mundo em água!


A força do mito na antiguidade grega impressiona ainda hoje, não apenas por seus efeitos sobre os helenos, mas também sobre nós. Diz-se que Afrodite nasceu do contato entre o mar e o órgão genital de Uranos, pai dos Titãs, que fora cortado pelo seu filho, Chronos. Pelo seu nascimento primordial em relação aos demais deuses do Olimpo, o poder de Afrodite se fez sentir sobre tudo e todos, mesmo sobre Zeus, o Deus dos deuses, quando este assumiu o comando. As festas em sua homenagem eram chamadas de festas afrodisíacas, suas sacerdotisas eram sagradas, cujo sexo doava a oportunidade única e sublime de entrar em contato com a própria deusa. Afrodite representa toda a emoção incontida, toda a avalanche de sentimentos e sensações que nos tomam e que razão alguma pode contê-los. A clareza da concepção de uma deusa assim para o amor é na verdade um exemplar grandioso do legado que os antigos nos deixaram sobre o mundo e sobre nós mesmos. A força oceânica de nossos impulsos mais selvagens fazem do amor o sentimento mais intenso e mais devastador, que domina homens e coisas, que age sobre nós e sobre o mundo. E era justamente a esta força incontinente que os gregos atribuíram a suprema beleza, a deusa do belo em si mesmo, a mais elevada forma de intuição estética. Porque ainda hoje não se pode negar a grande verdade já alcançada entre os gregos - o amor busca em tudo e sempre a beleza, e encerra sua própria busca nela. O amor é desejo, desejo pela beleza, um desejo não sensível, não comensurável, mas apenas intuído por nós e vislumbrado pela razão. E se não nos fosse esta última, jamais poderíamos entender a totalidade do amor no mundo, de sua força e intensidade oceânicas. Tales não por acaso, ao formular sua filosofia, a primeira de que temos notícia, anunciou - Tudo é água. E de algum modo ele tinha razão.

2 comentários:

azzi disse...

muito bom!
não tinha razão, era pulsão!...

Mathias de Alencar disse...

Não que não existisse razão, mas ela era o meio que se tinha para "guiar" nossas pulsões selvagens, já que não podem ser controladas. E quando então orientadas assim sabiamente pela razão, as pulsões acumulam mais força, mais riqueza, e mais beleza - pois aqui era dionísio e apolo em luta constante, e esta luta era a própria essência do espírito grego, demasiado humano. Mas você sabe tudo isso...