Por que estas pulsões ocêanicas?

Pois é verdade que se eu não havia sequer pensado sobre uma metáfora que ilustrasse com precisão poética e elegância filosófica - sim, com precisão poética e elegância filosófica! - aquilo que encontro frente ao espelho, este reflexo que se produz em minha consciência: ao pensar na força do mar, no impacto voraz das ondas sobre as rochas, no ímpeto por vezes desmedido e incontido de uma pulsão marítima, oceânica, encontro nessa visão a pintura natural de minha própria natureza. E talvez só me falte descobrir onde o pintor escondeu seus pincéis... Mas para quê? Não há em tudo isso significativa - perfeição?

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A poesia é a capacidade de condensar em belos versos a riqueza experiencial de nossas impressões. Ela é a mais elevada forma de arte literária - na verdade, literatura só é arte se participa intrinsecamente da poesia.

segunda-feira, 12 de março de 2012

A práxis da Guerra, nietzschianamente falando


Resumo em quatro sentenças - para uma arte da guerra intelectual legítima:
(1) Eu apenas ataco coisas que são vitoriosas;
(2) Eu apenas ataco coisas contras as quais jamais encontraria aliados, contra as quais tenho de me virar sozinho;
(3) Eu jamais ataco pessoas - sirvo-me delas para tornar manifesta uma situação de necessidade comum, mas furtiva e pouco tangível;
(4) Eu apenas ataco coisas contra as quais todo tipo de diferença pessoal é excluído - atacar é uma prova de bem-querer para mim e, conforme a circunstância, de agradecimento.

in Ecce Homo

Pintura: Goya, gravura n36, Desastre de la Guerra

Diálogos com a physis IV

- A um indivíduo capaz de um mínimo de consciência sobre sua condição no mundo, é dado perceber que: (1) ele é algo; (2) há algo de externo a ele, e que não se confunde com ele; (3) ele é capaz de relacionar-se com este algo a ele externo. Em (1), este algo que ele percebe ser subentende (a) o ser algo no mundo, em meio às coisas externas a ele, bem como (b) ser algo que possui a percepção de ser algo, ou seja, a percepção sobre sua própria existência. Deste modo, um indivíduo que vive é capaz de perceber não só a sua existência e a do mundo a ele externo, mas também a de si mesmo enquanto algo que se percebe a si mesmo - condição que o diferencia do mundo de coisas externas a ele. Até aqui, o que o indivíduo presenciou foi uma experiência de si, que subentende e subordina todas as outras que vier a ter a partir de então.
Contudo, na sua relação com o mundo, ele percebe que há outros seres capazes de perceberem-se a si mesmos tal como ele o foi, e que é possível estabelecer um diálogo com eles de maneira satisfatória - ou seja, de maneira que a percepção que ele teve torna-se compreensível ao outro, por meio da linguagem. Neste momento, inicia-se o que chamamos de cultura, e que mais uma vez irá subentender e subordinar todas as demais experiências que se lhe sucederem.

- O que é isto?
- Estou iniciando qualquer filosofia possível...
- Mas como? Não é a filosofia mesma uma discussão sobre ideias e conceitos universalmente válidos, compreensíveis a todas as pessoas? Esta 'sua filosofia' não restringe em demasia o âmbito da discussão ao puramente subjetivo?
- Sua pergunta já mostra o pouco entendimento que minhas palavras surtiram em seu espírito. E se não há entendimento, não há filosofia.
- Mas não há entendimento justamente porque você usa as palavras à sua maneira. É necessário um acordo prévio sobre o que entedemos por cada palavra que usamos, senão...
- Então não precisamos de filosofia, mas de um bom dicionário. Acho que o Houaiss é suficiente neste caso...
- Lá vem você de novo com sua ironia!
- Só a ironia pode fazer frente ao trágico da situação a que chegamos.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Preconceitos prejudiciosos e prejudiciais


Nieztsche dizia que o psicólogo tem de afastar a vista de si para enxergar - em outras palavras, afastar-se do eu imóvel e substancial para entender-se dialeticamente lançado ao movimento do mundo e das coisas à volta - do mundo e de nós mesmos, por certo, mas um movimento que esconde algo essencial, na verdade que o revela, a despeito do vir a ser eterno, ou por causa dele: o mundo do movimento e do ser-e-não-ser é em suma o mundo do ser no tempo, da essência no acidental, da forma no material. E todo psicólogo que se preze, ao olhar para o mundo e para o outro, tece sobre seu olhar as considerações mais inerentes à própria alma. Neste ponto, afastar-se de si é em suma encontrar-se no mundo. E é neste movimento que me encontro, e a ele tenho entregado o grosso das horas de meus dias. Mas não é isso um perder, um deixar de viver? A pergunta que deveria ser feita é esta - Há outra vida a ser vivida? Sócrates tinha razão, a despeito de Nietzsche.