Por que estas pulsões ocêanicas?

Pois é verdade que se eu não havia sequer pensado sobre uma metáfora que ilustrasse com precisão poética e elegância filosófica - sim, com precisão poética e elegância filosófica! - aquilo que encontro frente ao espelho, este reflexo que se produz em minha consciência: ao pensar na força do mar, no impacto voraz das ondas sobre as rochas, no ímpeto por vezes desmedido e incontido de uma pulsão marítima, oceânica, encontro nessa visão a pintura natural de minha própria natureza. E talvez só me falte descobrir onde o pintor escondeu seus pincéis... Mas para quê? Não há em tudo isso significativa - perfeição?

***

A poesia é a capacidade de condensar em belos versos a riqueza experiencial de nossas impressões. Ela é a mais elevada forma de arte literária - na verdade, literatura só é arte se participa intrinsecamente da poesia.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Gritos ecoando... III - O absurdo


Esteve durante todo o dia ali, absorto, introspectivo, mergulhado na mais completa desesperança que sua alma parecia alimentar desde que vira a chuva cair novamente sobre o telhado de sua casa, tão sem propósito, tão sem razão de ser como o eram seus dias de folga, cuja ausência de ocupação lhe permitia esses voos mais altos, até as nuvens, até o nada, em que a falta do que fazer se assimilava à falta de vontade de fazer alguma coisa, e então tudo lhe parecia como aquela chuva no telhado de sua casa, tão efêmero, tão passageiro, tão sem sentido, e nada absolutamente lhe interessava mais que o não fazer nada. Perder-se pela visão da chuva rasa, fina e constante, naquele último dia do ano, ano de grandes realizações e de algumas, não poucas frustrações, mas tinha sido, em grande parte um ano bom, sem levar em conta os cansativos dias de trabalho que se repetiam sem cessar, e o amor que já não mais possuía, novamente desejado, sem esperanças porém, porque ainda aquela dor que em seu peito era sentida lhe fazia esquecer-se de amar fosse mesmo a si, a sua alma, a sua existência, e esse desprezo por si mesmo, essa angústia por não ter oferecido uma atenção especial para seus próprios dilemas e opiniões era o que lhe pesava agora, sobre os ombros e os olhos, e lhe forçava a procurar algo que novamente lhe pudesse inspirar aquela esperança de outrora, já não mais sentida, já não mais negada – perder-se pela visão da chuva que caía sobre a terra era em seu coração o mesmo que perder-se dentro de si, a ver o mundo inteiro pelos olhos da nulidade completa de todas as coisas. E sentiu-se triste.
Por que não procurar algo para fazer? Não podia. Não queria trair a si mesmo de novo, como fizera durante anos. Queria ao menos dessa vez ser fiel ao que sentia, ao seu coração, àquilo que sua alma alimentava há tempos e que ele nunca ouvira, nunca havia estado assim, posto a escutar sua voz, mas agora ouvia, estavam nítidos os sons do infinito, água que se chocava contra água produzindo aquele som gostoso, prazeroso, e o céu repleto de nuvens, cinzentas como sua mente, o beijo trovejante das nuvens carregadas de águas, e que lhe aturdiam a mente, lhe provocavam o pensamento – por que vivemos, para quê? Que sentido pode haver em existirmos, nós e as águas, as nuvens, as matas? Que razão de ser há para que estejamos aqui, para que agora eu esteja aqui, vendo-as, ouvindo o som que ressoa de seu mais íntimo e que me revela a nulidade, o nada que se esconde por trás de tudo isso: aquele ser que não é, que parece ser e não é, que me diz que sou, mas não sou, agora aqui nada sou, nada faço, nada falo, ser nulo e pleno de ausência, um vazio imenso que me toma a alma, este sopro de vida que como o ar nada mostra, nada deixa perdurar, mas movimenta minha mente, minha ausência interior para o nada que há no mundo, e então me encontro frente ao impulso de gritar, de soltar a voz e o vento que ressoa de dentro, um grito para expressar o nada de mim para o mundo, e me conectar a esta ausência eterna universal.
Talvez isso tudo me leve a concluir que não poderia viver sem trabalho, sem uma ocupação, sem aquilo que nos afugenta desta voz interior universal, e que nos faz esquecer, deixar de ouvir a nós mesmos, a voz do nada do mundo, o nada de nossa alma. Talvez este vazio não seja suportável. O mundo e a vida ao nosso redor se movem sem se preocuparem com esse vazio. O mundo e a vida a nossa volta estão imersos no esquecimento do nada, na ausência do ser, de seu ser. A chuva cai sem pensar em por que cair continuamente sobre a terra, sobre o meu telhado, e nem a água se faz perguntar por que ser antes chuva que mar, pois talvez ela não tenha essa opção – mas e nós? Por que estamos fadados a contemplar esse espetáculo inapreensível de nulidades infindas? Por que somos esse ser que sempre se pergunta pelo ser das coisas, e só encontra nada? O que é afinal esse nada universal? Não sou capaz de ver com clareza, não posso saber com certeza. Mas entrevejo ali algum proveito, talvez haja alguma esperança – uma esperança que se põe a esperar pelo nada...

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Gritos ecoando... II


O desespero humano é assinalado por muitos artistas e pensadores como uma tendência inevitável do homem moderno, fruto direto da famosa "morte de Deus", provocada pela herança iluminista de uma Europa em plena efervescência econômico-cultural. O niilismo que atingiu as proporções mais espetaculares em nossa era, certamente em decorrência do caráter universal e globalizante da atividade cultural sob a égide do capitalismo, parece ter tomado a mente e o coração dos pobres humanos que caminham em direção não se sabe bem para onde, obrigando a religião e a arte, então consideradas fugas da crueza da verdade do real, os instrumentos por excelência da tentativa humana de transcender o sensível, a um apartheid da vida intelectual do homem comprometido com a "realidade" do mundo e com sua necessária miséria frente a ele. Mas o mesmo apóstolo deste niilismo em escala global foi o mesmo que se empenhou em mostrar que a arte podia sim, em sua intenção mais profunda, revelar a crueza da verdade do real, pois somente ela era capaz de afirmar a vida em toda a sua potencialidade, em toda a sua gratuidade. A arte era, para Nietzsche, a força soberana de afirmação da vida pela vida. A salvação da atividade artística encontrou na vida seu porto seguro, seu último reduto niilista. À religião, contudo, não coube tal sorte. Dificilmente um código religioso com tal ênfase (e existiram alguns) conseguiu tanta eficácia quanto sua companheira relegada. A questão talvez se justifique pelo simples fato de que uma religião sem deuses não poderia ser de fato uma religião. E em tempos de morte dos deuses transcendentes, as religiões como as conhecemos perderam seu sentido de salvação para o pensamento inquieto. Isso não impede, é claro, que existam outros tipos (grotescos, por sinal) de "religiões", cada qual com seus "deuses" específicos (veja, por exemplo, o interessante ato de fé dos "irmãos" no congresso, após receberem dinheiro suficiente para louvar a deus por mais alguns anos...)

A questão a ser posta aqui, entretanto, diz respeito a saber se de fato esta condição niilista a que o homem moderno se condenou pelo exercício de sua racionalidade não é antes propriamente humana, demasiadamente humana, inerente a nossa natureza e condição existencial. Pois se o absurdo da existência se revela pelo desnível que há entre a busca do homem pela unidade racional do mundo e a completa irracionalidade que ele encontra por trás de suas manifestações, onde a atitude transcendente, o salto, a escapatória desta angústia se dá sempre pela supressão de um dos lados em detrimento do outro, então a história do pensamento humano é a descrição sucessiva destas tentativas de escapar do absurdo, do niilismo a que fomos jogados por nós mesmos. Mas poderíamos de fato escapar desta encruzilhada permanente? O absurdo do salto transcendente em busca de uma solução para esta angústia retorna sempre e novamente, nos levando a indagar, juntamente com Camus – É possível ao homem conviver com o absurdo? Mas uma vez, qualquer tentativa de responder a este paradoxo seria um absurdo...
Pintura - O desespero, by Edvard Munch

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Gigante encoberto


Se o Brasil é um gigante adormecido, Mario Ferreira dos Santos é fundamentalmente um típico tupiniquim... Merece ser re-descoberto...

Gritos ecoando... I



O desespero que toma de assalto a alma do homem moderno é o sentimento que decorre daquela constatação fatal do resultado de sua ambição pelo conhecimento - ao final de seu percurso em busca da verdade o homem nada encontra de verdadeiro, e se angustia, se desespera, mergulhando no mais profundo niilismo, e ali nem Deus poderá salvá-lo: ele se afundou em sua mais completa impossibilidade de saber, e vilipendiado pela ânsia que sente de encontrar a verdade, destruiu todas as possibilidades de possuir um sentido para a sua vida. O homem desesperado impôs-se a angústia de ter assassinado Deus. A "morte de Deus" é o início da queda do homem. Podemos viver neste desespero constante?
A resposta é a solução para o enigma - mas quem a conhecerá? Melhor - quem a suportará?
Pintura - O grito, by Edvard Munch

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Os santos também pecam...



Quem algum dia, em seus mais juvenis desejos, não se imaginou nesta situação - ser uma americano (principalmente jovens brasileiros...), bilionário, desportista, morando em um palácio, com uma bela mulher, filhos, fama, posses, tranquilidade... Que mais desejaria um homem neste mundo? Eu respondo - o fruto proibido. Está na nossa natureza, diriam os judeus e cristãos, desejar aquilo que não nos foi dado. Mas o que mais poderia desejar um homem que já possui tudo isso? Novamente, a língua não para quieta - Mulheres! Ah, esse maior dos pecados de um homem! É verdade que muitos conseguiram se ver livres de alguma forma deste mal, seja matando a si mesmo, seja esganando a(s) mulher(es) que tanto o enfraquece. Mas para aqueles que aceitam a vida e a si mesmos como sendo o que são, aqueles que afirmam sua própria natureza não podem fugir de todas as fêmeas do mundo - é preciso enfrentá-las, e embora consigamos vencer algumas vezes, sempre haverá uma que nos golpeia mortalmente. E parece que a lua para Tiger Woods está cheia - o que não faltam são mulheres a lhe preencherem os desejos mais devassos, talvez aqueles que a sua mulher, mesmo linda, não poderia satisfazer. Porque está na nossa natureza, não se pode negar - e o poder é um péssimo amigo para as almas que tentam vencer os desejos desenfreados. Por isso, é verdade, até os santos pecam, o que nos mostra, no fundo, que é impossível ao homem a plena santidade. Mesmo que aquela vida que sempre nos foi oferecida como a mais perfeita que um homem pode ter - não é possível, a carne, aquela bendita reunião de músculos e nervos, nos puxa sempre para baixo. Graças a Deus por isso!

Metáfora da visão III



Em terra de cego, quem tem olho é rei!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Alguma poesia - Drummond



Algumas poesias que falam por mim, como se minha alma as tivesse ela mesma escrito estes versos enquanto eu os lia, neste seu primeiro livro de poesias.


Toada do amor

E o amor sempre nessa toada:
briga perdoa perdoa briga.
Não se deve xingar a vida,
a gente vive, depois esquece.
Só o amor volta pra brigar,
para perdoar,
amor cachorro bandido trem.

Mas, se não fosse ele, também
que graça que a vida tinha?

Mariquita, dá cá o pito,
no teu pito está o infinito.

***

Nota social

O poeta chega na estação.
O poeta desembarca.
O poeta toma um auto.
O poeta vai para o hotel.
E enquanto ele fez isso
como qualquer homem da terra,
uma ovação o persegue,
feito vaia.
Bandeirolas
abrem alas.
Bandas de música. Foguetes.
Discursos. Povo de chapéu de palha.
Máquinas fotográficas assestadas.
Automóveis imóveis.
Bravos...
O poeta está melancólico.

Numa árvore do passeio público
(melhoramento da atual administração)
árvore gorda, prisioneira
de anúncios coloridos,
árvore banal, árvore que ninguém vê
canta uma cigarra.
Canta uma cigarra que ninguém ouve
um hino que ninguém aplaude.
Canta, no sol danado.

O poeta entra no elevador
o poeta sobe
o poeta fecha-se no quarto.

O poeta está melancólico.

***

Poesia


Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira.


***


O Sobrevivente


Impossível compor um poema a essa altura da evolução da humanidade.
Impossível escrever um poema – uma linha que seja – de verdadeira poesia.
O último trovador morreu em 1914.
Tinha um nome de que ninguém se lembra mais.
Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós abotoam-se por eletricidade.
Amor se faz pelo sem-fio.
Não precisa estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta muito para atingirmos um nível razoável de cultura.

Mas até lá, felizmente, estarei morto.

Os homens não melhoram e matam-se como percevejos.
Os percevejos heróicos renascem.
Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado.
E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.

(Desconfio que escrevi um poema.)


***


Explicação


Meu verso é minha consolação.

Meu verso é minha cachaça. Todo mundo tem sua cachaça.

Para beber, um copo de cristal, canequinha de folha-de-flandres,

Folha de taioba, pouco importa: tudo serve.

Para louvar a Deus como para aliviar o peito,

Queixar o desprezo da morena, cantar minha vida e trabalhos

É que faço meu verso. E meu verso me agrada.

Meu verso me agrada sempre...

Ele às vezes tem um ar sem-vergonha de quem vai dar uma cambalhota,

Mas não é para o público, é para mim mesmo essa cambalhota.

Eu bem me entendo.

Não sou alegre, sou até muito triste.

A culpa é da sombra das bananeiras de meu país, esta sombra mole, preguiçosa.

Há dias em que ando na rua de olhos baixos

Para que ninguém desconfie, ninguém perceba

Que passei a noite inteira chorando.

Estou no cinema vendo fita de Hoot Gibson,

De repente ouço a voz de uma viola...

Saio desanimado.Ah, ser filho de fazendeiro!

À beira do São Francisco, do Paraíba ou de qualquer córrego vagabundo,

É sempre a mesma sen-si-bi-li-da-de.

E a gente viajando na pátria sente saudades da pátria.

Aquela casa de nove andares comerciais

É muito interessante.

A casa colonial da fazenda também era...

No elevador penso na roça,

Na roça penso no elevador.

Quem me fez assim foi minha gente e minha terra

E eu gosto bem de ter nascido com esta tara.

Para mim, de todas as burrices a maior é suspirar pela Europa.

A Europa é uma cidade muito velha onde só fazem caso de dinheiro

E tem umas atrizes de pernas adjetivas que passam a perna na gente.

O francês, o italiano, o judeu falam uma língua de farrapos.

Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só,

Lê o seu jornal, mete a língua no governo, Queixa-se da vida (a vida está tão cara)

E no fim dá certo.

Se meu verso não deu certo, foi seu ouvido que entortou.

Eu não disse ao senhor que não sou senão poeta?


Mil vistações, quem diria...

É muito gratificante saber que há sempre essa possibilidade de ser ouvido pelo outro, ainda mais neste espaço que é a internet, onde a pessoa à frente não está propriamente à frente, em um diálogo direto, mas em muitos milhares de outros mundos possíveis onde houver um pc e uma rede. Agradeço a todos pelas visitas, pelos comentários, pelo carinho e a participação neste projeto solitário de pensar o mundo e a si mesmo - que se percebe não tão solitário quanto parece...
Cesar de Alencar

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Para dispersar das preocupações...



Tudo bem - devo confessar que meu excesso de preocupação com questões políticas, se não em larga escala, ao menos aqui em terras tupiniquins, não são de modo algum uma preocupação salutar.
"Para quê? - me perguntaria algum carioca à beira-mar, sob um sol causticante de quase 45°, a admirar as belas fêmeas em Ipanema e aquelas curvas traseiras de tirar o fôlego de qualquer tentativa de pensamento - para que pensar nessas coisas? Esses políticos são tudo uma cambada de filhos da puta, não tem respeito nem por si mesmos, que dirá pelo dinheiro do povo. A gente tem é que votar nulo e aproveitar o resto do domingo na praia, porque o calor, meu amigo..."
Talvez eu ainda tentasse alguma réplica, o que de fato não seria muito difícil de fazer - mas como, ou para que afinal, se as eleições são só no ano que vem, se ainda teremos natal, ano novo, carnaval, páscoa, dia dos namorados, dias das mães, dia dos amigos, dia disso, dia daquilo... Para quê? A tal pergunta inconveniente não me deixa sossegar. Mas enfim minha alma pode sossegar tranquila; enfim não precisarei mais me ater em picuinhas tão inúteis como aquelas relativas a nossa política; enfim, os nossos políticos nos mostraram mais uma vez que quanto menos pensarmos em política, melhor - Para quem?
Eis mais uma dessas perguntas inconvenientes...

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Um incômodo auditivo



Para que os dedos se disponham a traçar uma sinuosa harmonia entre palavras e conceitos tão distintos entre si, criando assim aquilo que chamamos de discurso, fala, é necessário que antes haja um pensamento que de fato coordene e (ainda que não se queira admitir) crie esta sinuosa harmonia, única possibilidade de comunicação entre os homens - sem esquecermos que gestos e imagens precisam igualmente de harmonia e coordenação para que sejam entendidos. Isso nos mostra, dentre outras muitas coisas, que o animal humano, como bem afirmavam os antigos, é e será sempre um animal que pensa, cuja existência se realiza plenamente por meio do pensar. E somente quando algo muito me inquieta, me angustia, é que o discurso se realiza, a fala cria corpo, e a manifestação de meus pensamentos, seja aqui ou onde for, torna-se possível.
Pois no fundo certos assuntos problemáticos tem me incomodado deveras, e se percebo que de fato tais preocupações não estão na boca do povo, isso me revela apenas que sou um ser imerso em mim mesmo, criador de casos e de dores de cabeça pouco ou nunca necessárias, já que tudo corre a mil maravilhas no mundo e neste pequeno país latino-americano. Poderia ser que eu supusesse a maioria esmagadora das pessoas como seres extremamente despreocupados, que não param para pensar nestes problemas, haja vista já os possuírem às dezenas, por certo bem mais importantes que esses - mas não, como imaginar uma coisa dessas de mais de 6 bilhões de seres humanos? Se alguém está errado, incomodado, enlouquecido com o descaso do mundo pelo mundo - esse alguém que se interne, ou pense que lhe seja melhor talvez fugir deste mundo, já que a hipótese de compactuar com esse descaso lhe passa longe da boca...
Mas diga lá, senhor incomodado, o que tanto assim o inquieta?
Se alguém atravessou estes desabafos e chegou até aqui, isso talvez seja um bom sinal: talvez existam ainda pessoas preocupados com as coisas. Porque se dependermos de salvar o planeta (e junto dele, a nós mesmos) com a economia e a política do jeito que ela se realiza hoje, é bem provável que meus netos não possam ter filhos, já que nem mesmo a garantia de sua própria existência estará assegurada. A lógica que impera no mercado e nas casas, nas assembleias e nos botequins dos bairros, é a lógica da destruição em larga escala de todos os recursos que o planeta pode produzir, antes mesmo dele poder produzi-los. A voracidade do lucro imediato lança essa questão para um futuro que a depender desta voracidade não existirá.
Até aqui muito já foi dito. Não são poucos aqueles que anunciam os problemas da produção econômica de nosso mundo globalizado, e hoje mais que em qualquer época. Contudo, apenas um grito incontido de um povo em desespero não poderá nunca ser ouvido, no sentido mesmo de ser compreendido - no máximo o susto e o espanto é que são provocados. Pois é como antes falava: os homens só podem de fato se comunicar por meio de uma linguagem bem articulada, ordenada - ou seja, através de palavras que anunciem pensamentos. Os brados estridentes das comunidades internacionais, de países e/ou de celebridades do show business, não podem se fazer ouvir atentamente pelas massas favorecidas que controlam o mundo usando seus dólares, porque grito por grito nem os dos comunistas sobreviveram. Essa moderna "aristocracia" burguesa só tem ouvidos para uma voz, aquele som imaterial e inumano que o dinheiro lucrativo suavemente vai ressoando em seus ouvidos, como um canto da sereia mais bela, e mais digna de ser louvada. Como impedir esse encanto com gritos tão grosseiros e bárbaros, se a voz melodiosa do lucro é bem mais serena, mais límpida, mais civilizada? Há que se falar de outra forma com seres tão "refinados"...
E caberia ao governo este papel. É a política a única capaz de fazer frente aos interesses privados em favor do bem de todos. E uma teoria política que se construísse em oposição ao modelo econômico vigente deveria buscar outros valores, outras vozes a que ouvir, para livrar-se daquele encanto da miríade capitalista. Mas onde encontrá-las? Onde se podem ouvir outras vozes que não esta?
Este é um grande problema - e um grande incômodo...

Ps: A Skol não teve nada a ver com isso, claro...

Aforismos III



*Quem pensa que diz o que pensa, no fundo diz que não pensa - pense nisso!

*O agora é um presente-passado, e o futuro não será mais que o agora de um passado ainda por vir, um passado que agora nos é presente.

*O mundo é eterna mudança - e nada além disso.

*Uma vida sem ironia não merece ser vivida.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Polêmica?



Vamos (tentar) esquentar um pouquinho as coisas por aqui...
E ainda que eu pareça estar começando mais uma de minhas propostas devassas de expressão poética, o esquentar que se pretende fazer virá muito antes (espero) de um assunto que tem de algum modo se tornado uma polêmica nos lugares que frequento - qual seja, a eleição do Rio para sede das Olimpíadas de 2016. Isso porque para muitas pessoas, sobretudo aquelas preocupadas com a causa dos menos favorecidos e com a questão social de nosso país tão desigual, a vitória carioca parece ser um absurdo sem tamanho, já que a cidade muito pouco tem investido em saúde e educação, áreas sempre preteridas pela verba pública. Algumas chegaram mesmo a torcer contra a eleição do Rio. E a desilusão de estarem nas areias de Copacabana ao lado de uma multidão disposta a beber, cair, levantar, sustentando nos pés o samba e na boca o grito de alegria pela nossa vitória, foi tão amarga quanto uma manhã de dura ressaca depois de uma noitada daquelas. Mas isso me faz perguntar insistentemente - Será que a vitória de nossa cidade foi realmente a mais terrível consumação dos interesses do capital sobre os da sociedade, e que dela não podemos esperar nada senão mais miséria e desigualdade? Ou será que aqueles que se colocam contra o sistema econômico vigente (e sendo este o meu caso) precisam de fato recusar categoricamente esta excelente oportunidade de vermos mais uma vez o Rio como a grande capital cultural do país? Uma coisa nesta questão é certa: a vitória do Rio só possui potencialmente aquilo que dela nós poderemos fazer.
Qual a sua opinião? Se quiser opinar nesta 'polêmica', sinta-se à vontade. Afinal, a cidade (e a vitória) é de todos nós, impreterivelmente.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Metáfora da visão II



Posta assim, como ideal a ser alcançado pelo homem, continuamente, a visão perfeita obscurece algo que se faz latente e que mostramos já na primeira parte - a nossa natural deficiência para ver. pois quando pensamos melhor enxergar as coisas, quando elas se nos apresentam mais definidas, mais delimitadas, menos obscuras, acreditamos conhecer assim melhor estas mesmas coisas, melhor que os borrões de cores e de luminosidade de uma visão deficiente. Contudo, não há visão perfeita - ela permanece sempre um ideal para o homem, um ideal inalcançado, como também nos é o ideal do conhecimento. Estamos limitados naturalmente a ver de um determinado modo, e ainda que a filosofia nos permita superar aquelas grosseiras incapacidades de ver o mundo e a si mesmo, jamais alcançaremos o conhecimento-visão definitivos. Isto sempre nos será uma meta, um fim, um objetivo demasiadamente humano.
Embora o pensamento nos auxilie a ver melhor, não se pode desprezar a intuição confusa e indefinível de nossa visão primeira, fundamental. A tentativa constante do pensamento é de fazer com que o outro seja capaz de enxergar aquilo que estamos vendo pela intuição, ainda meio borrado, sem definição plena. Mesmo o pensamento só pode se voltar para esta visão parcial, indefinível, para encontrar o motivo de sua atuação - mas poderíamos perguntar: será a intuição uma deficiência de visão, como muito nos deixam entender? O avanço da ciência oprimiu significativamente toda a possibilidade de uma visão intuitiva. Ela configura até hoje o império soberano da razão. A intuição foi jogada aos limites da arte. E a filosofia deve, justamente neste ponto, separar-se da ciência - a filosofia, como busca da plena capacidade de ver o mundo e a si mesmo, não pode incorrer no erro científico e desprezar as nuances da razão. Pensamento e intuição não são formas antagônicas de ver o mundo, mas a única forma que o homem possui de enxergar plenamente a verdade. Embora isto lhe seja sempre um ideal.

domingo, 20 de setembro de 2009

Uma perda irreparável...


O criador da popular série de quadrinhos e desenhos animados japonesa "Shin-chan", Yoshito Usui, de 51 anos, foi encontrado morto nove dias depois de ser dado como desaparecido em uma região montanhosa do Japão. A polícia acredita que Usui caiu de um precipício de 100 metros quando passeava por uma trilha. Uma perda irreparável para a série hilária de mangá e anime. Mas Shin-chan não estará orfão - haverá sempre um fã seu espalhado pelo mundo...
Fonte: G1

A metáfora da visão I



Só quem já enxergou muito pouco é capaz de entender a importância da visão para a filosofia - aquela força gnoseológica do ato de ver, a que Platão e Aristóteles fazem constante referência, é própria da razão que deseja pensar o mundo e a si mesma. Contudo, de que forma isso se dá, eles pouco explicitaram, assumindo sempre como dado o fato de que a maioria dos homens concordariam que somente uma visão perfeita nos permite distinguir as coisas, e por isso, conhecê-las melhor. Mas a visão perfeita só aparece em face de uma dificuldade de visão: a miopia ou o astigmatismo são deficiências na capacidade de ver que, uma vez superadas, apresentam as coisas como elas realmente são. Enquanto permanecemos na deficiência, as coisas se apresentam sem definição clara, sem delimitações; elas se misturam, os limites entre elas desaparecem, o borrão de cores e de intensidade de luz nos confundem; podemos pensar que vemos algo que de fato não é, e o engano neste caso só se supera pela correção da deficiência. O que estes grandes filósofos disseram ser o conhecimento senão uma visão perfeita do mundo e de si mesmo? E a filosofia, senão o modo pelo qual podemos corrigir as deficiências naturais de nosso modo de ver as coisas? O pensamento, neste caso, é a lente de contato que nos permite superar as deficiências da visão e enxergarmos melhor aquilo que até então era indefinido.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Poesia e Filosofia


Ando de certo modo afastado deste meu espaço de reflexão e exposição artística, e sem dúvidas este fato é um reflexo de meu tempo consumido principalmente pela filosofia. Certa vez, um querido professor me perguntou se o meu desejo pela literatura era maior que pela filosofia, se eu queria me dedicar mais àquela que a esta, ou vice-versa. Minha resposta foi uma menção a Sartre - para mim até hoje uma referência de que o estudo da filosofia e a entrega artística não são completamente estanques e distintos quanto se imagina. E muito pouco eu sabia que, ao me dedicar à filosofia, eu encontraria em seu interior uma batalha tão intensa por sua afirmação contra nada menos que a poesia. Enquanto alguns afirmam uma proximidade entre elas, outros decidem por negar totalmente um diálogo entre as duas. E eu não poderia escapar aqui de tomar minha posição nesta batalha - e luto ao lado daqueles que as aproximam, pelo fato de ambas possuírem em comum algo de que não podem abrir mão: a linguagem.
E já agora me parece evidente que todo o problema em saber o que cabe a uma enquanto arte, e a outra enquanto ciência, não pode se restringir a um problema de linguagem: dizer que poesia e filosofia se distinguem pela forma de sua expressão é no mínimo afirmar que tanto uma quanto a outra precisam se restringir a um tipo específico de estilo, de termos, e que o uso desmesurado de um outro tipo que não lhe pertence expressa um anacronismo absurdo por parte daquele que o executa. Quem afirma tal coisa muito pouco conhece do desenvolvimento tanto da filosofia quanto da poesia. O desejo de as distinguir acaba por criar teorias absurdas que maculam as finalidades últimas de cada uma delas.
E qual seja? A que tende o criar estético e o pensar filosófico? Ambos, e novamente uma aproximação se faz necessária - ambos tendem à desenvolver uma reflexão sobre a existência humana. Esta é a finalidade de toda a busca filosófica e estética do homem. O que as distingue, e apenas isso, é o valor que se oferece na arte à intuição, e na filosofia à razão. Estes dois instrumentos, que pertencem a alma humana, e portanto ao modo de conhecer a si mesmo e ao mundo, são parte de todo o processo de desenvolvimento de uma autoconsciência do homem ao longo de sua história. E neste sentido, filosofia e poesia são inseparáveis: poder-se-ia mesmo pensar se elas de fato não deveriam estar plenamente unidas, imbricadas, confluindo para este mesmo fim; e alguns grandes filósofos e poetas de gênio já nos mostraram que não só isso deve se realizar definitivamente, mas da própria realização desta união depende um maior e mais profícuo conhecimento de nós mesmos.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Sonho e poesia




Imaginar que em teus sonhos esteja
navegando pela suave pele tua
como pétalas de rosa, como a lua,
faz surgir a paixão quando me beija.

Lua cheia de amor, que me faz tanto
amá-la até quando não mais puder,
enquanto minha vida lhe aprouver
até já não poder conter o pranto

de saudade, de dor, de amargura!
Ao perder em toda a vida o sentido
quando perco por ela tua ternura;

a poesia, nobre alma, se desfaz
em restos mortais de versos e amores,
de um único desejo - descanse em paz!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

O êxtase santo




"Eu me entregava à sua beleza, à sua juventude, como se desejasse possuí-las eternamente em meu próprio espírito – anelo este inexplicável pela palavra em sua frieza e rigidez conceituais, que inibem o verdadeiro da sensação, então mutável, cambiante, intensa. As palavras captam do mundo apenas o constante, o que se mantém, o que perdura. Captam o que é extenso. Somente um jogo entre elas pode trazer à luz uma nova experiência do experienciado. Experiência outra, porém. Pois não é outra aquela experiência provocada pela poesia. A palavra poética. A realidade em jogo, no jogo. Que produz um novo sentir. Uma nova pintura. A poesia é pintura criada por palavras. Imagens em versos. Analogias. A metáfora que nos permite de algum modo re-criar as sensações vividas. Estas minhas palavras re-criam o prazer. Por analogia. Sempre.
Que se crie uma imagem então. A imagem do prazer. Pois inútil era querer possuir aquela beleza juvenil eternamente. Por isso me lançava em seus braços, para haver-me por algum tempo com a divindade do amor, aquela mesma que nos orienta insistentemente para o que há de mais belo, onde quer que possa ser encontrado. O deus do amor é também o deus da beleza. Não à toa é ela uma mulher. E o nome de Afrodite me fizera suspirar naquele momento. Lembrando-me de meus amores, de seus corpos belos, das belas ninfas em êxtase divino. O fogo consumidor da alma amante. Que consome a fé e a loucura de nosso espírito. Que nos conduz ao sagrado. Como Bernini re-criou em uma escultura belíssima. Um êxtase santo! Ao lembrar-me desta imagem fico a pensar que nada há mais que dizer sobre o prazer. Não há qualquer necessidade de criar outra imagem tão bela! De uma profundidade tão imensa que ficamos sem palavras, em contemplação." (...)

"Olhei-o fixamente nos olhos, e enquanto o olhava, senti seu corpo adentrar-me ainda mais a fundo, levando-me instintivamente a cerrar os olhos e a morder os lábios, como se pudesse suplicar aos meus sentidos que me conduzissem à satisfação plena, ainda mais uma vez, e ainda mais forte que qualquer outra vez que eu já tivesse sido conduzida ao prazer. Acima, no espelho, eu o via soerguer-se tão freneticamente quanto um touro indomável, e mesmo que meus olhos teimassem em se esconder por detrás das pálpebras, pelo desejo de sentir mais intimamente os outros quatro sentidos, eu os forçava a contemplarem no espelho a beleza de me verem domada e possuída por aquela bela fera de lindos cachos negros. Cinco sentidos em profusão. Eu me sentia sendo conduzida aos céus! Eu mesma entoava ali os cânticos que a eles me enlevavam, gemidos extasiantes de plena loucura celestial, a loucura própria dos santos! Era como se meu corpo por algum tempo estivesse absolutamente absorvido pela luxúria, como se a devassidão desejasse ser vorazmente alimentada, e ao se alimentar, aumentasse ainda mais o desejo, esta minha vontade de querer ainda mais, de sentir eternamente o fluxo contínuo e vigoroso da paixão, fluxo em amor, sentir-se forte – strong, strange. Eu me sentia na pele de uma santa em contato íntimo com um anjo de fogo. Sentia como se Bernini me esculpisse ali. Era como se outra natureza me habitasse. Porque se nos foi dada a possibilidade de conhecer de que é feita a natureza divina, certamente o prazer de encontrá-la é admiravelmente similar ao gozo voraz da carne que dificilmente se sacia uma única vez. E sabiam disso todas as maiores religiões."


Trecho do livro Falosofia de Mulher,

by Cesar de Alencar


Imagem - O Êxtase de Santa Teresa - Gian Lorenzo Bernini
Mármore, 11,6x3,5 m. Período do Barroco, começo do séc. XVII
Igreja de Santa Maria della Vittoria, Roma

sexta-feira, 10 de julho de 2009



E se realmente a bela poupança brasileira tiver atraído a atenção de um super-potência? Que há de tão ruim nisso? Não é reconhecido o Brasil no mundo inteiro por suas belezas naturais? E se a um político de primeiro mundo interessam mais os dotes econômicos de um país emergente, onde ele se deixa levar por novos ares juvenis que despontam abaixo do Equador - O que tem de tão pecaminoso assim vislumbrar com atenção redobrada os fundos de uma nação amiga? Ah, deixemos de falso moralismo! A política é assim mesmo. A beleza não pode ser escondida como dólares na cueca. E, como mostra o vídeo que corre a net, o excelentíssimo senhor presidente dos Estados Unidos apenas se dispôs a ajudar uma compatriota sua a subir as escadas - no fundo, o pecado não é americano, mas francês! E que pecado é aquela excelentíssima primeira-dama francesa...

domingo, 28 de junho de 2009

Auscultar a vida



Alguma vez admiraste a beleza
que há no cair da chuva?
Ou provaste do prazer de acompanhar o curso
dos rios, a margear os campos verdejantes,
declinando por entre rochas em queda estupefatos?
Alguma vez visitaste uma praia onde fosse possível contemplar
o nascer e findar do sol?
Ou atentaste para ouvir uma canção,
a mais melodiosa que se pode auscultar – entoação de pássaros?
Pois saibas que se em tua alma
nada se lhe impôs dessa maneira
– Acautela-te! Podes morrer sem jamais ter vivido...

Good bye, Michael...



You're the best of the world's music
and there'll never be another equal - you are not dead,
you'll always be imortal for all of us!
Thanks, and good bye.

domingo, 17 de maio de 2009



Cada olhar de mulher que respiro,
cada verso escrito com prazer
deste amor, quando por não te ter,
excedo meus versos em martírio...

Cada lírico avesso da fortuna
num retrocesso que avança, sem querer,
jaz em meu peito, de inútil ternura
lançado por ti às favas do sofrer!

Se em teu olhar, ao menos a esperança
que colorem os belos campos virgens
gerasse a flor, na pureza de criança;

eu do amor não teria só miragens,
desvelaria na dor tua fragrância
- meu leito tornado mais que imagens!

Imagem, by Picasso.

Eu e a noite




Os passos que passavam lentamente
Enquanto eu caminhava pela rua
Eram os sons de um amor inconsequente
Que lhe deixaram, a noite, toda nua.

Extasiado fiquei completamente
Ao perceber que a bela luz da lua
Parada estava, bem na minha frente
Como se a noite fosse toda sua.

Ela me disse saber do nosso amor,
Sorriu pra mim e foi-se sem demora
E me deixou, só eu e minha dor.

Com um sorriso voltei, em plena aurora,
A caminhar, sabendo sem tremor,
Que os passos, desgraça, eram uma senhora.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

O fenômeno da beleza



Engraçado como somos pegos em certos momentos pela surpresa do incomensurável, por aquilo que não se pode prever e que por isso mesmo nos aterroriza e nos deslumbra. Era comum aos gregos o pensamento de que a filosofia nasce exatamente deste terrível que nos espanta, quando em face ao mistério da existência de si e do mundo, o homem se põe no caminho da ciência. E a ciência é esta consumação, própria ao espírito humano, de sua admiração pelo mundo, pela beleza que se percebe e que não se entende.
Entretanto, não há como evitar. Em nossa época mais do que em qualquer outra, essa busca humana de tornar o mundo reconhecível racionalmente, pela delimitação e especificação de tudo que acontece a uma causa, a uma explicação determinada, vê-se admiravelmente frustrada e debilitada quando nos percebemos diante do incondicionado, daquilo que não podemos prever ou medir. O mistério que envolve a existência, tanto quanto a realidade de tudo que há, nos é próprio, e dele não podemos fugir: o mistério e a sabedoria são os mais fundamentais de nossos conflitos.
O caso Susan Boyle nos remete a esta crise de nossa condição. A feiúra aparente cede lugar inexplicavelmente à beleza divina de uma voz que encantou o mundo há poucas semanas. Aquela moça recatada e tímida, que fora vítima dos risos e do infame descrédito que são capazes as pessoas de insuflar contra alguém, quando apenas a aparência leva a julgamentos extremos, mostrou-nos a todos a grandeza que pode se esconder entre as pequenas coisas.
Nada explica o encanto aterrorizante e deslumbrante por nós sentido ao vê-la e ouvi-la cantar, que este contraste que ela mesma suscitou, um contraste que se deu entre a visível feiúra de seu corpo e a beleza invisível e imaterial de seu espírito, sentida também em nossa própria alma, pela voz celestial que repercutiu aos quatros cantos do mundo. E que nos emocionou. Que nos fez ver além. Pois o corpo, a matéria se limita a ver tão somente aquilo que captamos em imagens, múltiplas e diversas, mas que nos iludem pelo pensamento de existir apenas isto que se vê.
Porém, há mais. Não à toa muito se afirmou serem enganosos nossos sentidos, e não menos a razão, quando operando sobre estes, tenta elaborar juízos e expressar verdades que se perfazem senão como aparentes e meramente sensíveis. Mas o essencial do mundo – e isso nos mostrou Susan Boyle – não está naquilo que somos capazes de entender e mensurar, mas quase sempre somos cegos para ver a verdadeira beleza de cada um, e da própria vida. E dessa forma, esta tão bela e divina criatura que agora fomos capazes de ver em Susan Boyle, em nada fica a dever àquela beleza que nos é sempre visível em sua maior referência, Elaine Paige.


'esse homem, caro Sócrates, verá bruscamente certa beleza, de uma natureza maravilhosa, aquela que era justamente a razão de ser de todos os seus trabalhos anteriores. Verá um que, em primeiro lugar, é eterno, que não nasce nem morre, que não aumenta nem diminui, que além disso não é em parte belo e em parte feio, agora belo e depois feio, belo em comparação com isto e feio em comparação com aquilo, belo aqui e feio acolá, belo para alguns e feio para outros. Conhecerá a beleza que não se apresenta como rosto ou como mãos ou qualquer outra coisa corporal, nem como palavra, nem como ciência, nem como coisa alguma que exista em outra, como por exemplo num ser vivo ou na terra ou no céu. Beleza, ao contrário, que existe em si mesma e por si mesma, sempre idêntica, e da qual participam todas as demais coisas belas'.

Banquete, Platão.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Uma peça fora de montagem...



Faz tempo que minhas palavras não se prendem a momentos fugazes aqui neste blog, mas desta vez não me é possível calar - urge deixar aqui registrado minha opinião, indignada opinião. Não queria estar perto da alma de Schiller, onde quer que ela esteja, neste dias em que sua grande tragédia está sendo encenada no CCBB; que gritos terríveis, de um profundo desespero, ele não deve estar soltando, às dúzias, a cada momento que a produção do senhor Antonio Gilberto entra em cena! Seria impossível a qualquer artista de gênio ver tamanha afronta à sua obra e não se indignar! Isso porque em quase três horas de espetáculo, em nenhum momento o espírito trágico, a essência mais pura da obra de Schiller, de seu projeto dramático, foi suscitada por essa montagem mediana. E que pior sabor para uma encenação que se pretende trágica o ouvir ao fundo o som de risos de sua plateia! Rir em um clima trágico é o avesso do sentimento que se pretende despertar! Como pode o intenso conflito de Elizabeth, o dramático lirismo de Stuart, despertar o riso em quem se prende ao seu drama? Mas não, ainda que pudesse parecer à primeira vista, a culpa não está na plateia, movida que foi ao riso, involuntariamente - caberia à produção do espetáculo o papel de provocar o sentimento catártico que só a tragédia é capaz de produzir! Pois onde estava a música, este primordial elemento de toda tragédia? Onde estava este instrumento próprio do clamor do coro, que nos conduz a alma ao ápice da sensação? Com uma iluminação incrivelmente patética, acompanhada da incrivelmente tosca interpretação de Clarice Niskier no papel de Elizabeth, fico a pensar se também nós não devíamos gritar com Schiller, para anunciar de algum modo que o espírito trágico jamais chegou aos palcos do CCBB. Ao menos estas minhas considerações sirvam como esse grito - mas quem ouvirá? Realmente foi uma pena ver um texto brilhante, em uma tradução sem igual de Bandeira, com poucos atores geniais, valendo a ressalva especial para Julia Lemmertz em mais uma contagiante interpretação, desperdizado assim, em uma palco onde grandes obras já foram apresentadas - mas nunca com um padrão tão mediano. Talvez se a peça não fosse uma tragédia, eu a considerasse uma grande produção como tantas outras ali apresentadas. Porém, se ela não fosse uma tragédia, ela não valeria estes gritos.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

O mundo em água!


A força do mito na antiguidade grega impressiona ainda hoje, não apenas por seus efeitos sobre os helenos, mas também sobre nós. Diz-se que Afrodite nasceu do contato entre o mar e o órgão genital de Uranos, pai dos Titãs, que fora cortado pelo seu filho, Chronos. Pelo seu nascimento primordial em relação aos demais deuses do Olimpo, o poder de Afrodite se fez sentir sobre tudo e todos, mesmo sobre Zeus, o Deus dos deuses, quando este assumiu o comando. As festas em sua homenagem eram chamadas de festas afrodisíacas, suas sacerdotisas eram sagradas, cujo sexo doava a oportunidade única e sublime de entrar em contato com a própria deusa. Afrodite representa toda a emoção incontida, toda a avalanche de sentimentos e sensações que nos tomam e que razão alguma pode contê-los. A clareza da concepção de uma deusa assim para o amor é na verdade um exemplar grandioso do legado que os antigos nos deixaram sobre o mundo e sobre nós mesmos. A força oceânica de nossos impulsos mais selvagens fazem do amor o sentimento mais intenso e mais devastador, que domina homens e coisas, que age sobre nós e sobre o mundo. E era justamente a esta força incontinente que os gregos atribuíram a suprema beleza, a deusa do belo em si mesmo, a mais elevada forma de intuição estética. Porque ainda hoje não se pode negar a grande verdade já alcançada entre os gregos - o amor busca em tudo e sempre a beleza, e encerra sua própria busca nela. O amor é desejo, desejo pela beleza, um desejo não sensível, não comensurável, mas apenas intuído por nós e vislumbrado pela razão. E se não nos fosse esta última, jamais poderíamos entender a totalidade do amor no mundo, de sua força e intensidade oceânicas. Tales não por acaso, ao formular sua filosofia, a primeira de que temos notícia, anunciou - Tudo é água. E de algum modo ele tinha razão.

Apressadamente



Os livros que correm às bancas

Correm, passos apressados

E atrasados correm à fora

Por aqueles vagões lotados

Correm por sobre trilhos

E carrancas, mal-encarados

Que ao correrem de si mesmos

Se desfazem embriagados

Até não poderem correr

Pela morte, enclausurados.

domingo, 22 de março de 2009

Seu silêncio



Falo, mesmo muda falo

sem palavras, sons ou nada

porque me revelo, calo

no velo da face marcada.


E se na face não falo

sem som, boca emudecida

pareço - pereço esmaecida;


que não me tomem apressada

em que não digo mais nada

pois quando me calo, falo.

Antigone's homecoming



Run to me now, dark river, run

inwards, backwards, blind

as the black, the one-eyed sun

parching all petals of the mind.

Mad sunflower point your gun

downwards, earth is calling her kind.

-

Full of eyelids, such a masque

will be the last one - go

folding all wings for the task.

Time's come for sinking slow

as fingers hover, yet do not ask

to what bottom nor how low.

-

By Bruno Tolentino, in O mundo como ideia.

sábado, 14 de março de 2009


Cordel dos Excomungados



I

Peço à musa do improviso

Que me dê inspiração,

Ciência e sabedoria,

Inteligência e razão,

Peço que Deus que me proteja

Para falar de uma igreja

Que comete aberração.


II

Pelas fogueiras que arderam

No tempo da Inquisição,

Pelas mulheres queimadas

Sem apelo ou compaixão,

Pensava que o Vaticano

Tinha mudado de plano,

Abolido a excomunhão.


III

Mas o bispo Dom José,

Um homem conservador,

Tratou com impiedade

A vítima de um estuprador,

Massacrada e abusada,

Sofrida e violentada,

Sem futuro e sem amor.


IV

Depois que houve o estupro,

A menina engravidou.

Ela só tem nove anos,

A Justiça autorizou

Que a criança abortasse

Antes que a vida brotasse

Um fruto do desamor.


V

O aborto, já previsto

Na nossa legislação,

Teve o apoio declarado

Do ministro Temporão,

Que é médico bom e zeloso,

E mostrou ser corajoso

Ao enfrentar a questão.


VI

Além de excomungar

O ministro Temporão,

Dom José excomungou

Da menina, sem razão,

A mãe, a vó e a tia

E se brincar puniria

Até a quarta geração.


VII

É esquisito que a igreja,

Que tanto prega o perdão,

Resolva excomungar médicos

Que cumpriram sua missão

E num beco sem saída

Livraram uma pobre vida

Do fel da desilusão.


VIII

Mas o mundo está virado

E cheio de desatinos:

Missa virou presepada,

Tem dança até do pepino,

Padre que usa bermuda,

Deixando mulher buchuda

E bolindo com os meninos.


IX

Milhões morrendo de Aids:

É grande a devastação,

Mas a igreja acha bom

Furunfar sem proteção

E o padre prega na missa

Que camisinha na lingüiça

É uma coisa do Cão.


X

E esta quem me contou

Foi Lima do Camarão:

Dom José excomungou

A equipe de plantão,

A família da menina

E o ministro Temporão,

Mas para o estuprador,

Que por certo perdoou,

O arcebispo reservou

A vaga de sacristão.


Autor: Miguezim de Princesa - Poeta popular,

paraibano radicado em Brasília.



Faço minhas suas palavras...

Deixando Sade dizer... II

Considerando.
Sade foi talvez o maior crítico da moral, o mais imoral de todos os homens, uma alma em que o prazer e a satisfação falavam mais forte que qualquer outro sentimento. Mas mesmo em meio a toda animalidade que permeia seus pensamentos e desejos, há um instante de lucidez e de senso, ambos atributos que a natureza nos legou. Suas palavras nos mostram que há uma idade da razão e do prazer. Porque é preciso conservar a criança em seu período de formação. Enquanto ela não atingir a capacidade de pensar e desejar por si mesma, de poder viver sua própria vida, deve ser mantida sob cuidados. Para além de ser desumano ou imoral - a pedofilia é inatural, antinatural. E para alguém que ama a natureza e a vida acima de tudo, como Sade, tal comportamento precisa ser condenado. Mas condenado até que ponto, se nada em Sade pode ser de fato condenável? A força da sociedade, sua legislação própria, seu senso de direitos e deveres - é ela que deve apresentar dentre seus costumes e leis as práticas que melhor couberem a seus cidadãos e a sua sobrevivência. Mas antes de ser um costume ou uma lei, o abuso da infância de alguém extrapola os próprios limites do âmbito social, para configurar-se em uma lei humana, naturalmente própria dos homens dotados de razão.

Deixando Sade dizer...


Quando disse que queria me ater em alguns tópicos sobre a pedofilia, o disse porque queria pensar de que maneira este ato pode causar tanta repulsa e indignação, e do qual, único em matéria de sexo, sou de mesma opinião que o senso comum. O que há de tão perverso e animalesco neste prazer? Pensar mesmo que alguém pode por ela sentir prazer...

À mente, não tarda vir um termo dos mais comuns para adjetivar um sujeito que pratica tal infâmia: sádico. E de onde vem o termo sadismo, senão do maior representante filosófico-literário da liberdade sexual? Sade foi não somente um escritor, mas uma vida profundamente marcada pela devassidão, pela libertinagem. E se o seu nome cunha termos tão macabros e difamadores, cabe-nos ouvi-lo dizer, para que tiremos cada um as próprias conclusões.


*******


É absurdo dizer que, mal uma moça sai do seio da mãe, deve se tomar vítima da vontade dos pais e assim permanecer até o último suspiro. Não é num século em que a extensão dos direitos do homem é cuidadosamente ampliada que as moças devem continuar na escravidão da família, pois o poder da família é uma quimera. Ouçamos a voz da natureza sobre coisa tão interessante; que os animais (que dela muito mais se aproximam) nos sirvam de exemplo. Neles, os deveres paternos não vão além das primeiras necessidades físicas. Assim que podem andar e comer sozinhos gozam de toda a liberdade, de todos os direitos e não mais reconhecem os autores dos seus dias nem o débito para quem os pôs no mundo. Por que então, a raça humana deve permanecer acorrentada a outros deveres, fundados tão somente na avareza e ambição dos pais? Por que uma moça que começa a refletir e a sentir tem que ser dominada pelo freio paterno?
Não foi apenas um preconceito imbecil que criou tais cadeias? Haverá coisa mais ridícula do que uma menina de quinze ou dezesseis anos, consumida por desejo que é obrigada a conter, esperando em tormentos inúteis, piores que os do inferno, que seus pais consintam, depois de lhe ter estragado a mocidade, em associá-la a um marido que não é do seu gosto, que ela não pode amar pois nada tem de amável, que tudo tem para ser odiado e para importunar e desmanchar todos os prazeres da sua idade madura? Não, tais laços não podem durar, é necessário libertar a moça da casa paterna desde a idade da razão. A educação devia ser dada pelo governo e aos quinze anos todas as mulheres deviam ser senhoras do seu nariz e do seu destino, livres para cair até mesmo no vício.


By Marquês de Sade, in Filosofia da Alcova
Ilustracion in Justine, 1800


quarta-feira, 11 de março de 2009

O desespero humano


Gosto desse espaço, porque tenho aqui a oportunidade de refletir verbalmente sobre o que me acontece ou o que vejo acontecer, e que de um modo similar é um acontecimento em mim mesmo. Sentir a dor do outro - alguns poderiam entender o que digo, pelo grau de sensibilidade que também possuem. Digo isso porque, ainda que tente entender, é para mim inexplicável o fato de alguém molestar sexual e mentalmente uma criança. E sobre isso quero pensar mais detidamente, em alguns tópicos.

Ah, o mar! Como não se sentir renovado frente a ele, em dias que parecem não passar, em noites que parecem não chegar! Mas cá estou de volta, como as ondas que vem e vão, tentando encontrar novamente minha voz perdida, esquecida, aqui dentro de mim mesmo.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Em período de trabalho intenso...

Bem, queria dizer que por estes dias, como já tem sido difícil postar aqui meus comentários, minhas reflexões, poéticas e filosóficas, o será agora ainda mais dificultoso, sobretudo pelo nível de trabalho que me tenho imposto esses dias de momentâneo descanso, desde a revisão de meu livro para publicação, que espero saia ainda este ano, até minhas novas demandas em filosofia e poesia, inspirações que me sobrevêm tão rapidamente quanto posso expô-las no papel... Obviamente, o resultado de tamanho esforço e dedicação, espero sinceramente, seja recompensado de inúmeras formas, sendo a principal delas o reconhecimento pelo outro de mim mesmo. E não é com outra finalidade que estarei por algum tempo ausente destas páginas diárias que me têm feito tanto bem.
Agradecendo a visita e os comentários, lembro sempre que este espaço não importa a ninguém mais senão a você, querido leitor. Sinta-se à vontade para comentar e criticar o que achar conveniente, sempre consciente de que toda crítica não passa de um ponto de vista...
Grande abraço.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Afinal, para descontrair...


Big cities' problems...


Obviedade fatal pela queda da moral
ou pela ascenção feminina?
- Nada, apenas o aquecimento global...


Today's a great day,
for the USA, for the world!
Take your seats,
Welcome to inauguration 2009...
Obama's the 44th president of the USA!
Congratulations north-americans,
you made better, you have do it!

sábado, 10 de janeiro de 2009

Início que inicio por uma ideia - agora sem acento!

I have an idea!
Se o mundo já nesse início de ano, novo ritmo, novo estilo, velhas esperanças - se tudo já nos parece tão caótico; se pelas incríveis notícias que fizeram o ano novo acordar mais... novo?
Vejam lá.
- A guerra civil entre israelenses e palestinos, mais uma vez e sempre;
- O apoio à guerra pelos EUA - mais uma vez e sempre;
- As prisões e as solturas, o atraso e o descaso, da justiça e do congresso;
- Novas mudanças para tirar a carteira de motorista - para evitar acidentes?;
- Mudanças na aposentadoria - para melhor?;
- Mudanças no cabinete das prefeituras - no Rio, o excelentíssimo senhor prefeito já assumiu a administração fazendo as mudanças de praxe: troca de auxiliares, de secretários, de verbas, e das cores da prefeitura! Pena o Cesar Maia não ter podido ir a cerimônia de posse, nada pagava esse momento histórico! (sic)
- As gostosas do Carnaval e do BBB assumindo as páginas dos jornais - colorindo-as em meio a tanto sangue palestino...
- Ronaldinho voltará a jogar!
- Até o meu curso de Filosofia entrou em processo de reestruturação curricular!
Pois então, não parece que tudo está tão... novo?
Deixo para vocês pensarem, porque no fundo o poço me parece o mesmo...
Calma aí! Vocês não acharam que eu estivesse me esquecendo da nossa grande mudança linguística, aposto que pensaram... É que o melhor, pelo menos pra mim, deve vir sempre no final - essa minha maldita esperança! - e propositalmente tive que deixar minha ideia para o final. Agora sem acento, pois entramos o ano inseridos rigorosamente no mundo português. Se eu gostei? Até que não achei tão ruim assim, pois vejam, o problema do hífen foi resolvido brilhantemente, é verdade que caíram alguns acentos importantes, mas quem ainda usava o trema? Futuramente, é certo, vai dar problema, quando um professor insistir em sala - É lingüiça, não linguiça! Mas por que, se não tem nenhuma diferença? Ouço já o mestre gritar - Porque é assim! É a tradição! Problemas para uma geração futura... - Não é problema nosso, dirão os espertinhos interessados em ganhar dinheiro com novos livros, cursos, como aqueles que deveriam não se interessam pelo problema da destruição do planeta pela voracidade de seu lucro.
Bem, acho que o ano começa muito bem: nada de novo, tudo seguindo à risca os preceitos das gerações passadas. E espero não ter infringido nenhuma lei linguística!
Isso só pode me levar a crer que, em nosso tempo mais que em qualquer outro, o único estudo fundamental que devemos fazer é o da História - Como disse Nietzsche: se o homem tivesse um propósito final em sua existência, ele já o teria alcançado...
Actually, I have a dream... a very nice dream.