Por que estas pulsões ocêanicas?

Pois é verdade que se eu não havia sequer pensado sobre uma metáfora que ilustrasse com precisão poética e elegância filosófica - sim, com precisão poética e elegância filosófica! - aquilo que encontro frente ao espelho, este reflexo que se produz em minha consciência: ao pensar na força do mar, no impacto voraz das ondas sobre as rochas, no ímpeto por vezes desmedido e incontido de uma pulsão marítima, oceânica, encontro nessa visão a pintura natural de minha própria natureza. E talvez só me falte descobrir onde o pintor escondeu seus pincéis... Mas para quê? Não há em tudo isso significativa - perfeição?

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A poesia é a capacidade de condensar em belos versos a riqueza experiencial de nossas impressões. Ela é a mais elevada forma de arte literária - na verdade, literatura só é arte se participa intrinsecamente da poesia.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Dor de elite é dor de todos...



Aqui no Brasil padecemos de um mal talvez incurável: somos devotos das classes mais elevadas, seja no que diz respeito à moda, a padrões de comportamento, à cultura, seja mesmo às reações que a nossa adorável burguesia costuma defenestrar quando ferida ou violentada. O último caso, but not least, e que nem mesmo será o último, experimentamos quase todos os dias nos noticiários e jornais da TV ou nos impressos, principalmente aqueles vinculados ao mundo Global. A morte (poderíamos dizer, humanamente sensibilizados: trágica) do filho da atriz Cissa Guimarães repercutiu de um modo avassaladoramente espetaculoso nas mídias do país, e se tornou, sem exageros propositais, uma tragédia nacional. Mas quem era Rafael Mascarenhas? Para quem não fazia parte de seu círculo de amigos era apenas o filho de famosos, garoto carioca zona-sul, que dispõe de todo o tempo (leia-se: $$$) para curtir o que a vida podia e pode oferecer a quem (quer? sic.) pode pagar. E no que ele se transformou após a tragédia? Num músico vitimizado pela barbaridade de outros e mais desmiolados garotos zona-sul? Num jovem que perdeu seu futuro (realmente bastante promissor, leia-se aí novamente: $$$) por causa da irresponsabilidade, devemos dizer, de outro jovem tal como ele, de mesma classe e de futuros similares? A perda irreparável de um filho foi aqui elevada ao grau de perda nacional! A festinha realizada por amigos e familiares no local do acidente na madrugada de ontem, com direito a grafites e menções a um pedido de mudar o nome do túnel em favor do jovem, tudo devidamente permitido (e por que não seria, hein?) pela digníssima Prefeitura do Rio, só serviu para nos mostrar que a elite é quem manda no Estado Democrático de Direito no Brasil. Vivemos numa oligarquia financeira, tem-se que admitir, e cada vez mais as funções do Estado se voltam para esta pequena classe de adultos endinheirados e jovens promissores que acreditam governar este país. O problema é que o povo constitucionalmente soberano permitiu e permite esta baderna com o que é público. O povo daqui se deslumbra com o luxo das classes mais elevadas, com seu modo de vida vazio de sentido, com sua fugacidade. A realidade dura demais dos menos favorecidos não se vê contemplada desse modo pela mídia ou pelo Estado. Afinal, são menos favorecidos justamente porque lhes falta esta contemplação. Mas quem iria querer contemplar com minutos preciosos na televisão ou nas páginas concorridas dos jornais os pesares e desprazeres daqueles que são obrigados a viver de verdade? Que pobre garoto de favela pode sonhar um dia em ver seu nome posto num local para homenageá-lo, seja mesmo em sua morte? Pode ser que o pobre cidadão não merecesse tal coisa. Mas o jovem promissor vítima da futilidade de nossa classe mais elevada não, ele merece, merece todas as honras do Estado e do povo, por que não? Afinal, se ele nada foi para a sociedade, era ao menos um anjo que se foi...

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