Ao ser perguntado que natureza encontrou nos homens em todos os lugares, o viajante que viu muitos países e povos e vários continentes respondeu: eles têm uma propensão à preguiça. Alguns acharão que ele teria respondido com mais justeza e razão: todos são timoratos. Eles se escondem atrás de costumes e opiniões. No fundo, todo homem sabe muito bem que não vive no mundo senão uma vez, na condição de único, e que nenhum acaso, por mais estranho que seja, combinará pela segunda vez uma multiplicidade tão diversa neste todo único que se é: ele o sabe, mas esconde isso como se tivesse um remorso na consciência - por quê? Por medo do próximo que exige esta convenção e nela se oculta. Mas o que obriga o indivíduo a temer o seu vizinho, a pensar e a agir como animal de rebanho e não se alegrar consigo próprio? Em alguns muito raros, talvez o pudor. Mas na maioria dos indivíduos, é a indolência, o comodismo, em suma, esta propensão à preguiça da qual falava o viajante. Ele tem razão: os homens são ainda mais preguiçosos do que timoratos e temem antes de tudo os aborrecimentos que lhes seriam impostos por uma honestidade e uma nudez absolutas. Somente os artistas detestam este andar negligente, com passos contados, com modos emprestados e opiniões postiças, e revelam o segredo, a má-consciência de cada um, o princípio segundo o qual todo homem é um milagre irrepetível; somente eles se atrevem nos mostrar o homem tal como ele propriamente é, e tal como ele é único e original em cada movimento dos seus músculos, e mais ainda, que ele é belo e digno de toda consideração segundo a estrita coerência da sua unicidade, que ele é novo e incrível como todas as obras da natureza e de maneira nenhuma tedioso. Quando o grande pensador despreza os homens, é a preguiça destes que ele despreza, pois é ela que dá a eles o comportamento indiferente das mercadorias fabricadas em série, indignas de contato e ensino. O homem que não quer pertencer à massa só precisa deixar de ser indulgente consigo mesmo; que ele siga a sua consciência que lhe grita: "Sê tu mesmo! Tu não és isto que agora fazes, pensas e desejas".
By Nietzsche, in Schopenhauer Educador (tradução N. C. de M. Sobrinho, ed. Loyola)
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