Talvez ele não volte. Talvez a vida não me apresente nada de novo e as flores quietas sem vento e o calor que me põe inconstante aqui dentro e fora e sempre continuem. Não gostaria de pensar que esta noite se repetirá, se não amanhã quem sabe outro dia ou ainda num ciclo eterno de ausências sem surpresas, de uma surpreendente mesmice que não cessa. Eu já sei. Sinto teu corpo bem perto, mas não vejo. Uma voz narra o destino da nossa luxúria. Perco as horas solitárias e os acasos determinados pelos sinos da igreja. Perco minha camisola, minha honra, meu futuro. Ganho ilusões e prazeres que só ao teu lado é possível desfrutar. Ao teu lado não posso. Espero ganhar novas roupas e valores. Quero observar a vida passar mas sem me ver ao fim inerte, desamparada. Quero me imergir na vida, cotidiana que seja, medíocre que seja. Não! Se alguma coisa aprendi foram tuas palavras indignadas: sem mediocridade! Serei superior à fatalidade que nos condena por um apelo mesquinho ao imediato da pulsão, mesquinho porque imediato, fatal porque condena. Há que se olhar o horizonte, o sol que desponta pela manhã, o céu azulado de tanto viver. Há vida. E ela não se resume aos anseios de carne, nem aos esmeros de espírito. A vida é tensão. Peca quem deseja os extremos. Sofre quem se apega ao fracasso de recusar-se a entender que não há dois caminhos mas muitos, e sequer se é capaz de escolhê-los um só. Todos os caminhos encontram-se repletos de rosas e espinhos, de dias e noites, de dores e de prazeres. Há que se escolher a vida.
Imagem: quadro de Edward Hopper
Imagem: quadro de Edward Hopper
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