Por que estas pulsões ocêanicas?

Pois é verdade que se eu não havia sequer pensado sobre uma metáfora que ilustrasse com precisão poética e elegância filosófica - sim, com precisão poética e elegância filosófica! - aquilo que encontro frente ao espelho, este reflexo que se produz em minha consciência: ao pensar na força do mar, no impacto voraz das ondas sobre as rochas, no ímpeto por vezes desmedido e incontido de uma pulsão marítima, oceânica, encontro nessa visão a pintura natural de minha própria natureza. E talvez só me falte descobrir onde o pintor escondeu seus pincéis... Mas para quê? Não há em tudo isso significativa - perfeição?

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A poesia é a capacidade de condensar em belos versos a riqueza experiencial de nossas impressões. Ela é a mais elevada forma de arte literária - na verdade, literatura só é arte se participa intrinsecamente da poesia.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Monumento ao jovem em formação



Nas obras de escultura de Margarida Santos cumpre-se a Arte. Porque elas contêm os pressupostos da razão de ser da obra de arte - a entrega total do ser liberto de compromissos, entrega feita de paixão, de sinceridade e de abnegação.
Ao contemplá-las mais demoradamente, não posso deixar de reflectir, pois descubro uma pureza de linguagem nas suas formas e linhas, sentindo que traduzem uma ânsia de regresso (mas não retrocesso) a um espaço sagrado, um encontro de signos transcendentes em que a magia, o fantástico, o desconhecido dum mundo interior, são sintomas dum neo-gnosticismo. Surgem-me, assim, como expressão do inconsciente, de um mundo novo (sagrado) em oposição com o mundo do tecnicismo e da sociedade de consumo (profano).
A artista está perto do limiar do espaço sagrado onde reside o Ego, abrindo a passagem ao inconsciente e às formas puras. Tal como em Moore, Brancusi ou Giacometti, as esculturas de Margarida Santos têm um significado tautogórico, com um sentido místico, como se os objectos se desmaterializassem para se tornarem na emanação de conceitos.

João Coutinho
in: Catálogo "Nu feminino" - 1991

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