Por que estas pulsões ocêanicas?

Pois é verdade que se eu não havia sequer pensado sobre uma metáfora que ilustrasse com precisão poética e elegância filosófica - sim, com precisão poética e elegância filosófica! - aquilo que encontro frente ao espelho, este reflexo que se produz em minha consciência: ao pensar na força do mar, no impacto voraz das ondas sobre as rochas, no ímpeto por vezes desmedido e incontido de uma pulsão marítima, oceânica, encontro nessa visão a pintura natural de minha própria natureza. E talvez só me falte descobrir onde o pintor escondeu seus pincéis... Mas para quê? Não há em tudo isso significativa - perfeição?

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A poesia é a capacidade de condensar em belos versos a riqueza experiencial de nossas impressões. Ela é a mais elevada forma de arte literária - na verdade, literatura só é arte se participa intrinsecamente da poesia.

domingo, 26 de outubro de 2008

Nunca mais

Mais um dia que eu a via sem lhe dirigir qualquer palavra. Queria dizer o quanto a admiro, a desejo, mas parece que as palavras fogem pela covardia. Covardia como falta de coragem – Falta-me coragem para lhe dizer o que sentia.
Às vezes ela havia sorrido para mim. Claro que já havíamos trocado algumas frases, sempre referentes ou à aula ou à matéria, nunca nada além disso. Houve uma vez que ela tentou falar sobre uma dificuldade que estava tendo em chegar mais cedo para estudar. Algo por demais trivial, como quase sempre acontece entre colegas de classe – Mas por que não consegui dar seguimento? Por que não indagar um pouco mais sobre os motivos que a faziam não conseguir chegar cedo à faculdade? Por que não provocá-la para que ela enfim falasse sobre si mesma – para que então eu pudesse falar sobre mim? Por que minha boca se fechava ao mais ínfimo desejo de confessar o que sentia?
Ela era uma garota muito interessante. Talvez fosse por isso que meus lábios estavam imobilizados. E se soubesse que nunca mais a veria, que nossas vidas seguiriam rumos tão diversos, que nos afastaríamos por tanto tempo! Pois ontem, quando a vi na fila de uma peça de teatro, lindamente vestida, completamente divina – Ah, quanto tempo faz! Teria então coragem para lhe dizer o que há tanto tempo sinto por ela? Mas seria este sentimento o mesmo que aquele de doze anos atrás? Dez anos depois, meus olhos ainda me convenciam de que sim, que era ainda o mesmo sentimento. Talvez uma paixão ardente, um fogo inextinguível – Talvez fosse amor, como por nenhuma outra mulher eu havia sentido.
Pouco mais de doze pessoas me separavam dela. A fila permanecia imóvel, à espera do espetáculo. Ela conversava com outra mulher. Pareciam grandes amigas. Isso me deixava com receio. Depois de dez anos, falar de algo que ela mesma nem se recorda, diante de uma pessoa desconhecida... Passaria por louco, certamente. Mas estou louco de amor! Amo aquela mulher, como a nenhuma outra! Devo lutar por ela? – Não devo. Serei incompreendido. Neste momento, passarei apenas por inconveniente - e não quero esse fardo.
Um cara se aproximou das duas. Pôs-se ao lado dela e... ele a beijou! – Não pode ser, beijou a mulher que amo! Não, não é verdade! Como posso tê-la perdido? Assim, sem tentar ao menos? Dói-me tanto o peito! Ela nunca saberá tudo aquilo que senti... Saí da fila do teatro e da vida dela, para sempre. E estarei para sempre ferido em meu peito. Para sempre dilacerado pelo meu próprio destino.

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